Todos deveríamos ler Paper Girls, de Brian K. Vaughan!

A “história de Paper Girls” tem início em 1988 e acompanha um grupo de raparigas de 12 anos, durante a sua rota de distribuição de jornais. Estas não são as típicas raparigas de 12 anos, com bicicletas decoradas com fitas brilhantes, em vez disso elas usam sticks de hóquei para proteção e walkie-talkies.

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Como é que a história começou? Estavas a andar de bicicleta e tiveste a ideia?

Brian K. Vaughan (BKV): Não. As ideias nunca surgem com alguma atividade física. Sou muito preguiçoso, quer dizer, sou velho. Estou à beira dos 40 anos e sou pai. O ano de 1988 foi o ano em que tinha 12 anos e parece há muito tempo atrás. Quis escrever sobre as minhas memórias de ter 12 anos, enquanto ainda me lembrava delas.

Estas são personagens femininas. Foi importante criar “Paper Girls” e não “Paper Boys”? Quando se ouve falar de paper Girls não se percebe o que significa, mas se ouvirmos o termo “Paper Boys” sabemos exatamente do que se trata.

BKV: Gosto de personagens femininas (…). Normalmente existem uma ou duas mulheres simbólicas, mas não existem equipas predominantemente femininas (…). Aqui estava uma oportunidade de fazer algo que sempre quis fazer, um grupo de mulheres, sem ter que me defender ou explicar, apenas escrever sobre elas.

Que género de preconceitos tiveste que pôr de lado na história?

BKV: A protagonista feminina define-se sempre pelo rapaz com quem tem uma relação ou com quem sai. Eu queria escrever uma história sobre quatro miúdas que não estão preocupadas… com o sexo oposto. São uma espécie de gang muito mais interessado em estar umas com as outras, desafiando os adultos que lhes devem dinheiro, para poderem comprar música ou jogos Nintendo. Tentei evitar as histórias de relações que são comuns nos filmes dos anos 80 e deixar que a sua amizade fosse o assunto principal da história”. 

“Paper Girls” teve sempre a intenção de ser um comic? Foi assim que o idealizaste?

BKV: Sim. Tenho sorte de ter trabalhado em cinema, televisão e comics, mas quando tenho uma ideia, decido isso desde o início. “Isto parece mais uma série para televisão”, ou “Isto parece-me um comic”. Nunca é “Oh, isto seria ótimo para fazer um filme, por isso vamos fazer o livro primeiro e depois tentar adaptá-lo”. Paper Girls foi criado para ser um comic!

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Porquê?

BKV: Há coisas que funcionam muito bem em comics e noutros meios não. Podemos criar séries, como na televisão. Podemos apaixonar-nos pelos personagens durante um longo período de tempo e vê-los crescer e mudar. Mas, temos um orçamento ilimitado, que a TV não tem. Se quiser colocar numa dupla (duas páginas juntas) uma cidade com dinossauros gigantes, posso fazê-lo. Isto nunca seria possível com o orçamento para a televisão. Sempre que me acontece pensar assim, percebo que a história é para o meio de todos, a banda desenhada. É realmente superior à televisão de várias maneiras.

Sabes como vai acabar a história? Já tens um final planeado?

BKV: Claro. Nunca faço histórias sem saber como vão acabar. 

O que há nos anos 80 que torna tão fácil assumirmos que, ao virar da esquina, há um monstro? Foi um momento mais simples? O que é que nesse passado nos permite torná-lo irónico?

BKV: Não sei. Acho que muita da ficção de que gostávamos naquela altura tinha menos a ver com a década (anos 80), e mais com o facto dos filmes estranhos que podiam ser feitos na época. Podia-se fazer uma coisa como “Os Goonies”, e seria sempre original. Hoje em dia isso é mais difícil. Acho que nos anos 80, embora houvesse muitas coisas terríveis, havia muita criatividade e surgiam ideias loucas, estranhas e descartáveis. Foi uma época muito divertida, penso nela sempre com carinho, mas definitivamente com muita admiração.

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O que querias evitar ao escrever no passado? 

BKV: Não sei. Não acho que houvesse muita coisa, honestamente. Não estava muito preocupado com armadilhas que possam surgir sempre que se faz algo que compara o passado e o presente.

O que eu disse ao Cliff é o mais importante: que estas quatro protagonistas tenham 12 anos de idade. Isto foi o mais importante para mim. 

É mais fácil não teres limites ao argumento, ou não haver limites na banda desenhada?

BKV: Para mim mais fácil não ter limites, mas é é uma dor para os artistas. Eu levo segundos a escrever: Desenhar um estádio cheio de robots com uma cabeça de televisão”. Isto leva que tempos a desenhar. 

Como é que o trabalho do ilustrador afeta o teu trabalho? Alguma ilustração já mudou o que sentes sobre um personagem ou um enredo?

BKV: A 100 por cento (…). As personagens são sempre a duas dimensões na minha cabeça, até ver as ilustrações. Quando vejo o Cliff desenhar a Mac ou a Erin no livro, é quando elas se tornam reais.

Iniciei a minha carreira na banda desenhada, numa época em que os argumentistas eram as estrelas. Mas o meu percurso acabou por ser um processo para eu entender que os escritores sempre ficam atrás. Este é um meio de artista e estamos aqui para os para servir. Eles não trabalham para nós. A minha vida ficou mais fácil depois de perceber isso.

(Traduzido e adaptado de “You all should be reading Brian K. Vaughan’s ‘Paper Girls’ comic series now” por Meredith Woerner. Los Angeles Times, 2015)